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10 de abril de 2019
FOCO 2019 – Camila José Donoso
Foco 2019 – Camila José Donoso
Os filmes de Camila José Donoso apresentam um cinema de transformação. Ao longo de seus três longas-metragens e vários trabalhos curtos, a cineasta chilena (nascida em 1988) vem construindo um corpus de grande potência inventiva e experimentação estética, atravessada por temas caros aos tempos atuais. Em seus filmes, a transformação ocorre pela auto-reinvenção, mudança que frequentemente se dá tacitamente no corpo das personagens filmadas. São mulheres que superam diversas barreiras normativas em suas vivências cotidianas, com seus corpos desviantes e em processo de envelhecimento, em filmes que brincam deliberadamente com os limites dos regimes ficcional e documental. Trata-se do cruzamento de diversas fronteiras ligadas a gêneros historicamente instituídos, sejam eles sexuais ou cinematográficos, na mostra Foco na 8ª edição do Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba – a primeira retrospectiva da cineasta já realizada no Brasil.
Camila estará presente no Olhar de Cinema para participar de debates após as sessões e ministrar uma conversa aberta ao público, na qual ela exibirá curtas-metragens de diferentes momentos de sua carreira além de comentar os seus processos criativos. Essa aula está conectada à outra frente de atuação da diretora que é o ensino, sendo ela uma das responsáveis pela Escola de Cinema Experimental Transfrontera, em Arica, no Chile. Por fim, além dos longas dirigidos pela realizadora chilena, a Foco propõe ainda diálogos entre seus trabalhos e os de cineastas de diferentes nacionalidades que de alguma maneira a influenciaram.
Os filmes de Camila têm passado em festivais importantes ao redor do mundo como Roterdã, BAFICI, Berlim, FICValdivia, Art of the Real, entre outros. Em Naomi Campbel (2013), seu longa de estreia (co-dirigido com Nicolás Videla), acompanhamos o cotidiano de Yermén, uma mulher trans de Santiago em busca do financiamento que lhe possibilitaria realizar a tão sonhada cirurgia de redesignação sexual. Seu segundo longa,Casa Roshell (2017), foi desenvolvido na Cidade do México durante um período em que a diretora viveu no país e se passa na casa noturna gerenciada por Roshell Terranova, espaço de fantasias onde os homens que entram podem se transmutar naquilo que desejarem. Já seu longa mais recente, Nona. Si me mojan, yo los quemo (2019), que fará sua estreia brasileira no Olhar de Cinema, lida com questões de auto-exílio, amor e vingança, sendo conduzido pela força de uma protagonista sexagenária inspirada na avó da diretora.
“Estamos muito contentes em exibir o trabalho de uma realizadora que tem desenvolvido seus longas na fricção entre documentário e ficção”, diz Antônio Junior, diretor geral e artístico do Olhar de Cinema. “Seus filmes revelam uma inquietação pela busca de intimidade com os personagens, ao mesmo tempo que explora caminhos dentro da potência cinematográfica para unir forma e conteúdo de modo que as respectivas histórias e personagens se fortaleçam. Desde seus primeiros trabalhos ela dá voz a corpos que possuem pouco espaço dentro das narrativas cinematográficas. Camila é uma cineasta que se arrisca por caminhos não tradicionais do cinema, porém sem perder de vista a importância de estabelecer uma comunicação muito sensível com sua audiência”.
A marca que perpassa a filmografia de Camila é a da liberdade, na qual encenação convive com registro documental em cenas inventadas conjuntamente com as pessoas filmadas. Seus filmes são constituídos por laços de afeto – familiares, comunitários – ligados aos ativismos LGBTIQ e feminista, perpassados por memórias coletivas da sociedade chilena nas últimas décadas. Aliado às proposições formais, presenciamos um refinado e consciente processo de atrelar vida e filme que ganha nessas singulares “transficções” (como a própria diretora as designa), obras em contínuo processo de experimentação com texturas e bitolas, criando paisagens sonoras que enriquecem o campo filmado pelos tempos e personagens que residem fora do quadro.
Os filmes da Foco serão exibidos em DCP. Os títulos confirmados para a mostra são:
Camino Gris (dir. Camila José Donoso, Chile, 2007, 8min)
Nona (dir. Camila José Donoso, Chile, 2014, 10min)
Naomi Campbel (dir. Camila José Donoso e Nicolás Videla, Chile, 2013, 82min)
Casa Roshell (dir. Camila José Donoso, México/Chile, 2017, 71min)
Nona. Se mi mojan, yo los quemo (dir. Camila José Donoso, Chile/Brasil/França/Coréia do Sul, 2019, 86min)
Sueños de hielo (dir. Ignacio Agüero, Chile, 1993, 55min)
Ninouche (dir. Valérie Massadian, França, 2011, 24min)
T.R.A.P (dir. Manque La Banca, Argentina, 2018, 16min)